Quando a vida já não tem propósito - Afirmar-se com Nietzsche

Por detrás desse niilismo pessoal e – assim o esperamos – episódico, que é a depressão, Nietzsche detecta uma depressão mais geral, a depressão de toda uma civilização, de toda uma época, que às vezes age de maneira subterrânea. Nietzsche descreve o niilismo nestas palavras muito sucintas:

Niilismo: falta o ‘propósito’, falta a resposta para ‘por quê?’. O que significa o niilismo? – que os mais altos valores se desvalorizam” (Fragmento póstumo de 1887, 9 [35]).”

O niilismo parece então associar uma paralisia prática e um nada teórico. Já não conseguimos agir, já não sabemos o que fazer, porque já não sabemos o que pensar. Já não conseguimos acreditar no sentido da vida, nem nos objetivos que havíamos estabelecido para nós mesmos, nem nos valores que defendíamos e respeitávamos. O que nos fez deixar de acreditar? Por que os nossos valores mais altos se desvalorizaram? Uma decepção? Uma traição? Um acidente da vida? Ou simplesmente a frustração, o esgotamento do fracasso repetido?

Para aquele que foi o mestre filosófico de Nietzsche, Arthur Schopenhauer, é a crueldade impiedosa da existência que faz com que ela se desvalorize a si mesma. A vida é uma luta incessante para satisfazer nossos desejos cegos e tirânicos que, assim que são satisfeitos, nos decepcionam e nos empurram para uma nova busca ainda mais desesperada. Por conseguinte, “a vida oscila, tal como um pêndulo, entre a dor e o tédio” (O mundo como vontade e representação, 1. c. § 57). A única saída consiste em renunciar ao desejo, em “negar a vontade de viver”, em preferir a morte à vida, não escolhendo o suicídio, mas vivendo como um morto, como alguém que renunciou a tudo o que está vivo em si.

Todos conhecemos esses episódios de desânimo nos quais tudo nos parece vão e doloroso. No entanto, em certas pessoas, os desejos impetuosos se combinam com uma sensibilidade à flor da pele, de tal sorte que o desejo, a vontade e a vida lhes aparecem necessariamente como um sofrimento interminável e absurdo. Como chegamos aí? Como a vida pode negar-se a si mesma? Eis a questão que atormenta Nietzsche, e que o levará a se opor, cada vez mais frontalmente, àquele que foi seu mestre.


ebook MOC Afirmar-se com Nietzsche, Balthasar Thomass

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